Queda de helicóptero do filho de Alckmin

A responsabilidade objetiva do Perito do caso da queda de helicóptero que resultou na morte do filho de Geraldo Alckmin

Este artigo foi redigido com base inteiramente nas fontes disponíveis, não representando qualquer tipo de juízo de valor ou apontamento contra os profissionais citados nas matérias jornalísticas.

O ofício do Perito Judicial em uma Investigação Criminal é determinante para a elucidação autêntica dos fatos e crucial para a devida responsabilização dos verdadeiros autores do ato criminoso investigado.

Dito isso, neste artigo, nós vamos abordar sobre os reflexos legais e judiciais decorrentes de práticas de um Perito Judicial, analisando um recente caso concreto.

Trata-se do caso do perito do Instituto de Criminalística, Hélio Rodrigues Ramaciotti, que no último  dia 27 de março, que, segundo o Jornal da TV Globo, foi condenado pela justiça de São Paulo, por falsa perícia e irregularidades na elaboração do laudo pericial, alusivo a queda do helicóptero que ocasionou a morte de Thomaz Alckmin, filho do atual vice-presidente do Brasil, Geraldo Alckmin e de mais 4 (quadro) ocupantes.

Relembre o caso: Queda de helicóptero com filho de Alckmin

O acidente ocorreu em abril de 2015, com a queda da aeronave EC 155 B1 da Eurocopter, empresa Seripatri.

A queda da aeronave provocou a morte dos 5 (cinco) ocupantes, sendo Carlos Haroldo Esquerdo Gonçalves (piloto comandante do proprietário), Paulo Henrique de Moraes (mecânico do proprietário), Leandro de Souza Santos (auxiliar de mecânico da Helipark), Erick Canhabate Martinho (mecânico inspetor da Helipark) e Thomaz Rodrigues Alckmin (passageiro, filho do então Governador do Estado de São Paulo, Geraldo Alckimin).[1]

O perito do Instituto de Criminalística, Hélio Rodrigues Ramaciotti, nomeado pelas autoridades policiais de alçada, concluiu seu relatório 5 (cinco) meses após o acidente, atestando que as pás da aeronave se soltaram por desconexão na cadeia de comando.

A tese apresentada no lado elaborado por Hélio,  foi a mesma da aeronáutica e a que foi acolhida pelo Delegado responsável pelo Inquérito, qual seja, que por um erro do mecânico da empresa HELIPARK, ao fazer a manutenção, esqueceu de colocar um parafuso no lugar, de modo que as hastes ficaram soltas e o piloto não tinha o controle total sobre a aeronave.

Contudo, em 2017 o Ministério Público ofereceu uma denúncia contra o perito Ramaciotti, alegando que ele teria mentido nas informações repassadas ao inquérito policial.

A partir de análises de especialistas, o Ministério Público suspeitou que a queda do helicóptero se deu por outro motivo. Diante disso, o Instituto de Criminalística, então, realizou uma segunda perícia e apontou que o acidente ocorreu por problemas na manutenção das pás, feita pela empresa HELIBRAS, dias antes da queda.

De acordo com os especialistas que elaboraram o novo laudo, nesta manutenção foi feita uma pintura nas pás e, depois, não se respeitou o prazo de uma semana para a secagem, que é indicado no manual do helicóptero. [2]

O Laudo Pericial e o perito

Hélio Ramacciotti era perito do Instituto de Criminalística e à época foi o perito designado pelas Autoridades Policiais competentes, para apurar as causas da queda do helicóptero.

Ressalta-se que, segundo informa o jornal da TV Globo, Hélio Ramacciotti incluiu diversas afirmações falsas no inquérito policial, citando informações de exames que não fez e não participou, além do mais, Hélio teria copiado informações idênticas do relatório preliminar.

O laudo pericial elaborado por Hélio, serviu como prova conclusiva para o prévio indiciamento por homicídio culposo de 5 (cinco) colaboradores da empresa Helipark, proprietária do hangar de onde a aeronave decolou, que o Juiz competente, posteriormente, determinou o desindiciamento.

No seu laudo pericial, Hélio concluiu que as pás da aeronave se soltaram por desconexão na cadeia de comando, um dispositivo mecânico entre o piloto e as asas móveis.

Contudo, esse resultado levantou suspeitas de outros profissionais que trabalhavam no caso, e, diante disso, o Instituto de Criminalística (IC) refez o estudo e constatou que o acidente ocorreu por consequência da quebra de uma das pás da hélice.

Isso teria acontecido porque, dois dias antes do acidente, a empresa fez a manutenção de maneira incorreta e não respeitou o prazo de secagem após a pintura do equipamento.

Além do mais, após a perícia realizada pelo perito Hélio, no lado pericial de sua autoria sob nº 474.990/2015, este inseriu as seguintes informações falsas, conforme menciona a Juíza do caso em sua decisão:

1) Conforme trecho a seguir declinado, extraído do próprio laudo pericial sob nº 474.990/2015, o Perito Hélio Ramacciotti cita falsamente que o painel das chaves Trim Feel não estava danificado e tinha as chaves em posições adequadas.

Neste sentido, contrariando o que foi atestado por Hélio, posteriormente, foi elucidado pelo Ministério Público, nos termos da nova perícia realizada pelo IC,  que o painel estava sim danificado e as chaves próximas não estavam em posição adequada para voo, como a “LG Pump”, que não deveria estar em “emergência”

2) E, ainda, no tópico que discorreu sobre “Dos exames combustível e fluído hidráulico”, Hélio Ramacciotti inseriu resultados de ensaios realizados em amostras de combustíveis dos motores e de fluídos hidráulicos dos sistemas integrantes da aeronave, como se tivessem sido realizados por ele, no entanto, não foram;

3) De mais a mais, o perito afirmou que a aeronave possuía um certificado diferente do que realmente tinha. Dentro das hipóteses para a queda que estavam sendo abordadas naquele momento, fazia toda a diferença atestar se a aeronave tinha certificado FAR 27 ou 29. Neste sentido, Hélio aduz no laudo que teve contato com uma aeronave que era a versão militar do helicóptero que se acidentou, entretanto tratava-se de versão de outro modelo, assim sendo, menciona falsamente em seu laudo que a aeronave EC-155 B1 era certificada FAR 27, quando na verdade é FAR 29.

4) Na parte da “Conclusão e Encerramento do laudo” o perito menciona que “o resultado dos exames laboratoriais relativos aos fluído hidráulico e do combustível da aeronave sinistrada” concluindo que “estavam dentro das especificações normativas vigentes”, afirmando tais condições como se a perícia tivesse sido realizada por ele, o que, posteriormente foi comprovando que se tratava, mais uma vez, de uma inverdade.

Em nota, encaminhada por sua defesa à TV Globo, Ramaciotti informou ser “perito criminal há quase 30 anos, sendo reconhecido por sua competência e capacidade profissional. A decisão proferida desafia a evidência dos autos e, certamente, será revertida na instância superior. Inclusive, é teratológica a punição proferida com base em ilações, ainda mais que o laudo feito por nosso cliente trouxe a mesma conclusão daquele confeccionado pela Força Aérea Brasileira – representada pelo CENIPA[3], afirmou o advogado de Hélio, Dr. Daniel Leon Bialski.

A denúncia e a condenação contra o perito Hélio Rodrigues Ramacciotti

A denúncia proposta contra o perito Hélio Rodrigues Ramacciotti foi apresentada em março de 2018, pela promotora de justiça Camila Moura e Silva, frente à 1ª Vara Criminal de Carapicuíba do Estado de São Paulo.

Na oportunidade, o Ministério Público solicitou todas as fotos obtidas quando da realização das pericias, as quais estavam anexas ao inquérito policial, e, após a análise das fotos e fatos por outros profissionais de alçada, foram identificadas diversas contradições no que Hélio havia constatado quando da elaboração do seu lado pericial, conforme acima exposto.

Após os devidos tramites legais, no último dia 27 de março, a juíza Carolina Hispagnol Marchi, condenou o perito Hélio Rodrigues Ramaciotti, por falsa perícia e irregularidades na elaboração do laudo sobre a queda de helicóptero que resultou na morte de Thomaz Alckmin, filho do vice-presidente da República, Geraldo Alckmin.

Na sua decisão, que diga-se de passagem contém 74 laudas baseadas em relatório e fundamentações, a Juíza salienta que:

Nota-se que o réu traiu a confiança nele depositada pelo Instituto de Criminalística de São Paulo e pelos cidadãos, praticando os fatos com violação ao dever para com a Administração Pública e em procedimento de grande notoriedade e repercussão”.

A Juíza condenou Hélio a uma pena definitiva de 3 (três) anos, 1 (um) mês e 10 (dez) dias de reclusão e pagamento de 15 (quinze) dias multa, no mínimo legal.

À luz do que garantem os artigos 33 e 59, do Código Penal, a juíza fixou o cumprimento da pena em regime aberto.

Muito embora a magistrada tenha determinado pouco mais de 3 (três) anos de prisão em regime aberto, a pena foi convertida em prestação de serviços à comunidade e pagamento de um salário mínimo a uma entidade pública ou privada com destinação social.

Além disso, da condenação também decorreu a perda do cargo de servidor público do Perito Hélio.

Da importância de respeitar as legislações de alçada

Conforme dito acima, segundo a TV GLOBO, na denúncia proposta contra o perito Hélio, o Ministério Público evidenciou uma série de informações falsas em laudos assinados por ele naquela oportunidade.

O fato foi descoberto porque outro profissional comparou o Laudo elaborado pelo Perito Hélio com o da aeronáutica, que logo percebeu que algumas partes do documento se tratava de uma cópia fiel do documento oficial.

Neste sentido, como bem menciona a Juíza em sentença: “Por fim, mesmo quanto aos itens do seu laudo de mera descrição ou referente a parte de perícia que acompanhou com os técnicos da aeronáutica, limitou-se a copiar os pareceres dos órgãos técnicos da aeronáutica”.

Com base no caso concreto ora em análise e no âmbito da Computação Forense, a responsabilidade técnica do Perito em Forense Digital é ainda mais delicada, diante do caráter volátil da prova digital, eis que emerge a indispensabilidade de um perito judicial especialista em forense digital dominar as legislações correspondentes.

Especialmente a ABNT NBR ISO/IEC 27037:2013, a qual fornece diretrizes para atividades específicas no manuseio de evidências digitais, que são a identificação, coleta, aquisição e preservação.

E, segundo a ISO 27037, o tratamento da evidência digital deve ser realizado pelo Perito Digital obedecendo, veementemente, 4 aspectos fundamentais, a saber [4]:

  1. Auditabilidade: Possui o intuito de determinar se o método científico, técnica ou o procedimento foi adequadamente seguido. É altamente recomendado que os processos realizados sejam documentados para uma avaliação nas atividades realizadas;
  2. Repetibilidade: Este conceito é considerado quando os mesmos resultados de testes são produzidos utilizando os mesmos procedimentos e métodos de medição, utilizando os mesmos instrumentos e sob as mesmas condições, e pode ser repetido a qualquer tempo depois do teste original;
  3. Reprodutibilidade: Este conceito é válido quando os mesmos resultados são produzidos utilizando diferentes instrumentos, diferentes condições; e a qualquer tempo;
  4. Justificabilidade: Este conceito tem como objetivo justificar todas as ações e métodos utilizados para o tratamento da evidência digital. A justificativa pode será considerada demonstrando que a decisão foi a melhor escolha para obter toda a potencial evidência digital.

Quer saber mais sobre as diretrizes dispostas na ISO 27037? Confira nosso artigo clicando aqui.

Para se tornar um Perito Judicial expet na matéria, dominar as legislações que dão suporte à perícia forense e possuir as certificações necessárias para atuar com segurança, conheça o Portfólio de treinamentos da Academia de Forense Digital, os quais te proporcionam o alicerce ideal para atuar com propriedade e autoridade em demandas judiciais.

Conclusão

Especialmente em relação as circunstâncias acima citadas, é importante ressaltar que elas quase tiveram força de alterar drasticamente a tramitação do inquérito policial, pois, sucederam, inclusive, em indiciamento indevido de terceiros por homicídio culposo, tanto que, posteriormente, o juiz competente determinou o desindiciamento delas.

Conforme menciona o Ministério Público de São Paulo na Denúncia, as informações falsas reduzidas a termo sob a responsabilidade técnica do Perito Judicial Hélio, aliadas a outros erros da investigação, “quase fizeram mudar os rumos do inquérito policial“, além de resultarem no indiciamento de outras pessoas indevidamente.

No que toca ao indevido indiciamento de terceiros como autores ou coatores de um crime, o Código Penal garante que:

Denunciação caluniosa:

Art. 339. Dar causa à instauração de inquérito policial, de procedimento investigatório criminal, de processo judicial, de processo administrativo disciplinar, de inquérito civil ou de ação de improbidade administrativa contra alguém, imputando-lhe crime, infração ético-disciplinar ou ato ímprobo de que o sabe inocente: (…)”.

Ou seja, além das infinitas consequências administrativas, policiais e judiciais a nível pessoal e social, que os atos profissionais de um Perito Judicial podem acarretar, o profissional também fica sujeito a responder penalmente por incriminar pessoas inocentes, mediante a elaboração de um laudo pericial equivocado, que pode ser utilizado como prova cabal de um crime doloso ou culposo.

É importante considerar também que, caso as fraudes do laudo pericial elaborado por Hélio não tivessem sido identificadas em momento oportuno, por um profissional devidamente preparado e apto para tanto, diversas pessoas inocentes estariam respondendo pelo homicídio do filho do vice-presidente da República.

Conhecimento e qualificação adequada é primordial para qualquer área profissional, por isso, qualifique-se com o time da Academia de Forense Digital.


Referências

 

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