Como funciona a remoção de conteúdo da Internet?

Como funciona a remoção de conteúdo da Internet?

Em determinados casos, a responsabilidade do provedor de internet por danos decorrentes do conteúdo gerado por terceiros na web, é subsidiária, e, por isso, caberá ao provedor de aplicação de internet o dever de remover um determinado conteúdo ilícito produzido por terceiro.

Para entender como funciona o processo de identificação do responsável legal para a remoção de determinado conteúdo ilícito disponibilizado por terceiros, bem como aprender a diferença entre provedor de aplicação de internet e provedor de conexão à internet e suas respectivas responsabilidades legais e muito mais, continue a leitura deste artigo!

Introdução

Que a Internet se tornou um ambiente para o pleno e fácil exercício do direito da liberdade de expressão, é indiscutível. No entanto, também é inegável o aumento drástico de dados pessoais circulando na rede.

Estudos dão conta de que, estima-se que a quantidade de dados produzidos é duplicada a cada ano. Para se ter uma ideia, em 2016, a projeção de dados na rede corresponde ao equivalente à produção de dados em toda história da humanidade até 2015.[1]

A partir dessa realidade foi que a vigência de legislação especifica para este ambiente se tornou determinante, emergindo, em meados de 2014, o Marco Civil da Internet, oficialmente sancionada Lei n° 12.965, de 23 de abril 2014, a qual dispõe sobre diversas questões relacionadas ao uso desse importante veículo de comunicação, conforme introduz o próprio dispositivo legal, estabelece princípios, garantias, direitos e deveres para o uso da Internet no Brasil.

Muito embora a mencionada legislação tenha buscado garantir o pleno exercício do direito individual da liberdade de expressão, bem como, aliado a isso, almejou evitar a censura, há diversas situações específicas e individuais que carecerem de que determinado conteúdo seja removido da rede, melhor dizendo, se torne indisponível.

Atualmente, os casos mais registrados pelas plataformas de modo geral, envolvendo remoção de conteúdo na rede, são os casos de propagação de fake news, compartilhamento de publicações ofensivas e/ou de cunho difamatório ou discriminatório, criação de perfis falsos, ameaças anônimas, aplicação de golpes digitais, vazamento de fotos íntimas, entre outros.

Indisponibilização de conteúdo pelos provedores de Internet

Atentos a essa realidade, no treinamento sobre Direito Digital da Academia de Forense Digital, o Professor Pedro Borges Mourão ensina que Indisponibilização é o termo utilizado pelo Marco Civil da Internet nos artigos 19, 20 e 21, entretanto, seu significado é variante, conforme o objetivo da pretensão, compreendendo também Deleção, Exclusão ou Remoção, Desindexação e Esquecimento.

Contudo, conforme bem lembra o Prof. Pedro Mourão em aula, recentemente o Supremo Tribunal Federal, consolidou o entendimento de que no Brasil não se reconhece a possibilidade de que alguém tenha o direito de ser esquecido, pois prevalece o direito à informação, conforme Tema 786 do STF, abaixo transcrito:

“Repercussão Geral – Tema 786 – “É incompatível com a Constituição Federal a ideia de um direito ao esquecimento, assim entendido como o poder de obstar, em razão da passagem do tempo, a divulgação de fatos ou dados verídicos e licitamente obtidos e publicados em meios de comunicação social – analógicos ou digitais. Eventuais excessos ou abusos no exercício da liberdade de expressão e de informação devem ser analisados caso a caso, a partir dos parâmetros constitucionais, especialmente os relativos à proteção da honra, da imagem, da privacidade e da personalidade em geral, e as expressas e específicas previsões legais nos âmbitos penal e cível”.”[2]

Por isso que é possível concluir que, toda as vezes que estivermos diante de questões de controle de conteúdo, inevitavelmente, serão contempladas questões sobre direito da informação aliadas com outros direitos, na maioria das vezes, o direito a honra, a vida privada, a intimidade, entre outros.

E, ainda, o professor Pedro ressalta 3 aspectos essenciais a serem salientados no tocante a indisponibilização de conteúdos na internet, vejamos:

1ª. Consideração: A indisponibilização de conteúdo é pretensão a ser deduzida em face do provedor de aplicação, que é o controlador do dado, o que será melhor explanado a seguir.

2ª. Consideração: A identificação do usuário é uma demanda de “duas cabeças”. Exige que primeiro haja a identificação do usuário da aplicação para, em seguida, de posse deste dado, exigir-se a identificação do usuário do terminal de onde a conexão ao provedor do serviço de internet originou-se.

3ª. Consideração: A pretensão de indenização será deduzida em face do CPF ou CNPJ, responsável pela publicação. Isto é, aquele que foi identificado, a partir de dados fornecidos pelo provedor de conexão, como o usuário responsável pela publicação.

Qual a diferença entre provedor de aplicações de internet e provedor de conexão de internet?

O provedor de aplicações de internet é a pessoa física ou jurídica que disponibiliza, por meio do trafego da rede, as funcionalidades utilizadas pelos usuários da internet, como exemplo dessas aplicações, podemos citar os provedores de busca, como o Google e o Yahoo, os de hospedagem, como o UOL, bem como os correios eletrônicos, como o Outlook, Gmail, Hotmail, além dos provedores de conteúdo, como blogs pessoais, jornais etc.

Em contrapartida, e numa esfera bem mais limitada, o provedor de conexão fornece tão somente a infraestrutura utilizada pelos usuários para acesso as aplicações acima citadas.

Em outras palavras, os provedores de conexão é um serviço instrumental, ou seja, de meio, não de fim, e é por esse motivo que não faz parte do risco do seu negócio o controle de conteúdo publicado pelo terceiro, cujo risco é assumido pela atividade dos provedores de acesso a internet.

De quem é a responsabilidade de remoção de conteúdo na internet?

Preliminarmente, cumpre destacar que, a remoção de conteúdo é o instrumento por meio do qual o titular dos dados exerce um direito personalíssimo e, por essa razão, há que se falar nas características dos direitos da personalidade.[3]

E ainda para dar ensejo ao tema, é importante ressaltar que, muito embora o provedor de conexão esteja diretamente conectado a rede de fornecimento de acesso a web, ele não pode ser responsabilizado pela não remoção do conteúdo, considerando que é inviável pensar que ele teria meios de monitorar e conter as atividades de todos os usuários que trafegam na internet.

É ciente dessa realidade, que o art. 18 do Marco Civil é incisivo ao desincumbir o provedor de conexão da responsabilidade civil por danos oriundos de conteúdo gerado por terceiros, vejamos:

Art. 18. O provedor de conexão à internet não será responsabilizado civilmente por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros.

Este artigo consolida a premissa de que o provedor de conexão apenas possibilita que o usuário tenha acesso a internet, estando isento de qualquer responsabilidade de remoção do conteúdo gerado e transmitido por usuários ou por terceiros.

No entanto, o provedor de aplicações de internet que não indisponibilizar o conteúdo gerado por terceiros, e após o recebimento de notificação judicial ou extrajudicial, deixar de promover a remoção, de forma diligente, no âmbito e nos limites técnicos do seu serviço, será responsabilizado pelos danos inerentes da sua omissão, é o que garante o artigo 19 do Marco Civil da Internet, que dispõe que:

Art. 19. Com o intuito de assegurar a liberdade de expressão e impedir a censura, o provedor de aplicações de internet somente poderá ser responsabilizado civilmente por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros se, após ordem judicial específica, não tomar as providências para, no âmbito e nos limites técnicos do seu serviço e dentro do prazo assinalado, tornar indisponível o conteúdo apontado como infringente, ressalvadas as disposições legais em contrário. (grifos nossos)

Diante da análise do artigo acima transcrito, pode-se afirmar que[4]:

  1. restou clara a responsabilidade subjetiva por omissão do provedor que não retira o conteúdo ofensivo, após a devida notificação judicial;
  2. a mera notificação extrajudicial, em regra, não ensejará o dever jurídico de retirada do material;
  3. esta opção de responsabilidade coaduna-se com o objetivo de assegurar a liberdade e evitar a censura privada;
  4. o Judiciário foi considerado a instância legítima para definir a eventual ilicitude do conteúdo em questão;
  5. a remoção de conteúdo não depende exclusivamente de ordem judicial, de forma que, o provedor poderá a qualquer momento optar por retirar o conteúdo, quando poderá eventualmente responder por conduta própria.

Quais conteúdos devem ser removidos voluntariamente da internet pelos provedores de aplicação?

Os conteúdos que devem ser removidos pelos provedores de aplicações, independentemente de determinação judicial, são aqueles que violam a intimidade da pessoa humana e a sua vida privada, mediante a publicação de imagens, vídeos ou de outros materiais contendo nudez ou atos sexuais.

Nesses casos, as regras são distintas das dispostas nos artigos 18 e 19 anteriormente estudados, senão, vejamos:

Art. 21. O provedor de aplicações de internet que disponibilize conteúdo gerado por terceiros será responsabilizado subsidiariamente pela violação da intimidade decorrente da divulgação, sem autorização de seus participantes, de imagens, de vídeos ou de outros materiais contendo cenas de nudez ou de atos sexuais de caráter privado quando, após o recebimento de notificação pelo participante ou seu representante legal, deixar de promover, de forma diligente, no âmbito e nos limites técnicos do seu serviço, a indisponibilização desse conteúdo.

Assim sendo, considerando o que garante o artigo 21 do Marco Civil, os conteúdos envolvendo a violação da intimidade decorrente da divulgação, tais como, mas não limitado a imagens, vídeos ou doutros materiais contendo cenas de nudez ou de atos sexuais de caráter privado, sem que os envolvidos autorizem, após notificação extrajudicial pelo usuário, devem ser removidos imediatamente pelo provedor de aplicação de internet.

Para aprender mais sobre o Marco Civil com o time AFD, assista ao Webinar abaixo sobre  “O que o profissional de Forense Digital precisa saber sobre Marco Civil da Internet?”

O papel do poder judiciário na remoção de conteúdo na internet

Nos dias atuais, é gradual o aumento de número de usuários que aderem às plataformas digitais que hospedam conteúdos de seus usuários, como as redes sociais e os blogs.

É mister elucidar que os conteúdos ali depositados, são de responsabilidade de cada usuário, tendo em vista que é inadmissível pensar que as plataformas possuem estrutura tecnológica para monitorar, conter e especialmente filtrar todos os conteúdos produzidos por todos os usuários a todo instante e de forma preventiva, ou seja, antes que eles sejam postados, ou, até mesmo depois.

Essa realidade foi facilmente percebida pela Turma de Ministros do Superior Tribunal de Justiça – STJ, quando do julgamento de repercussão geral do Recurso Especial nº1.568.935:

Não constitui atividade intrínseca da rede social a fiscalização prévia dos conteúdos que são postados em sua plataforma, de modo que não se pode reputar defeituoso o site que não examina e filtra os dados e imagens nele inseridos (REsp 1.641.155). Não se pode impor ao provedor de internet que monitore o conteúdo produzido pelos usuários da rede de modo a impedir a divulgação de futuras manifestações ofensivas contra determinado indivíduo (REsp 1.568.935).

No mais, no que toca aos fatos ocorridos anterior ou posteriormente à publicação do Marco Civil da Internet, o STJ definiu o seguinte posicionamento:

Para fatos anteriores à publicação do Marco Civil da Internet, a responsabilização dos provedores de aplicação por veiculação de conteúdo ofensivo não depende de notificação judicial, bastando ficar demonstrado que houve ciência acerca da informação lesiva e que esta não foi retirada em prazo razoável.

Após a entrada em vigor do Marco Civil da Internet, o termo inicial da responsabilidade solidária do provedor é o momento da notificação judicial que ordena a retirada do conteúdo.[5]

Conclusão

É incontestável que atualmente os provedores de aplicações e serviços na internet, como mecanismos de busca e plataformas de mídia social, são parte essenciais na experiência na internet e na comunicação interpessoal entre os usuários, estreitando as relações e otimizando o cotidiano.

Atento a essa realidade e aliado ao afastamento da censura no mundo virtual, o Marco Civil afastou a responsabilidade irrestrita dos provedores de aplicações de internet, quanto aos conteúdos publicados por terceiros na web.

Deste modo, ao contrário dos provedores de acesso à internet, os quais nunca serão responsabilizados por conteúdos disponibilizados por terceiros, os provedores de aplicações na internet serão responsabilizados quando não cumprirem a condição determinada pela lei, qual seja, remover na internet determinado conteúdo ilícito gerado por terceiros após determinação judicial específica ou após notificação extrajudicial do interessado, nas condições estabelecidas em lei.

Cabe, por tanto, nos termos do Marco Civil da Internet, ao Poder Judiciário a apreciação do conteúdo especifico, garantindo, desta forma, uma maior segurança para os negócios desenvolvidos na internet e a construção de limites para a expressão na rede mundial.


Referências:

Conheça nossos treinamentos

Introdução a Cripto Ativos

Metodologias Nacionais de Perícia Digital

Perícia Digital Para Advogados

Mitre Attack

Triagem de Malware

Passware Kit Forensics: Do Zero ao Avançado
Gratuito para Law Enforcement